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Tomada de Decisão Apoiada

 

 

A relação entre a psiquiatria e o direito civil vem sofrendo profundas transformações. Inicialmente tratadas como “loucos de todo gênero”, pessoas portadoras de transtornos mentais já foram indistintamente passíveis de interdição civil com base num determinismo biológico e totalmente restritivo de autonomia. Posteriormente tornou-se necessário, além do adoecimento mental, o reconhecimento de redução do discernimento, mas mantendo-se a essência restritiva de autonomia. Ademais, o desejo do interditando historicamente se restringiu ao polo passivo da “defesa”. A lei 13146/15 modificou alguns paradigmas, e menções específicas a transtornos mentais foram suprimidas do Código Civil. A interdição foi relativizada, limitando-se proporcionalmente a aspectos patrimoniais e negociais das “pessoas com deficiência” e daquelas incapazes de “exprimir sua vontade”. Ao introduzir a “Tomada de Decisão Apoiada” (TDA), deu direito à autodeterminação de pessoas com redução de discernimento, podendo haver nestes casos conservação de autonomia. Com natureza voluntária e personalíssima, a TDA prestigia indivíduos que desejam preservar o exercício pessoal da vida civil e que, cientes das próprias limitações, sejam capazes de expressar judicialmente o anseio por apoio de terceiros. Para tal, e na presença de adoecimento psiquiátrico, é importante que estejam íntegros, ainda que parcialmente, volição, juízo de morbidade, pensamento e linguagem. Estes pré-requisitos podem ser encontrados em alguns quadros neuropsiquiátricos como retardos mentais leves, síndromes demenciais iniciais, doenças neurodegenerativas e disfasias vasculares. Em doenças afetivas, os déficits cognitivos nas fases de eutimia podem conduzir à TDA. Já nas esquizofrenias, tudo dependerá do controle da psicose e do grau de comprometimento por sintomas deficitários.

 

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Capacidade civil e o princípio da dignidade

 

A dignidade da pessoa humana, como princípio jurídico fundamental, certamente está presente em todo o direito civil, inclusive na teoria da responsabilidade. Tal concepção ocupou o centro da formação do direito moderno pela escola do direito racional e acabou sendo absorvida pelas escolas de influência positivista que as sucederam. Por isso, desdobramentos da dignidade da pessoa humana são elementos chaves para a compreensão dos diversos modelos de responsabilidade civil.

O reconhecimento da autonomia na seara existencial tem exigido dos intérpretes uma revisitação das causas de incapacidade civil, impedindo, desse modo, que as restrições impostas ao exercício de direitos e obrigações por pessoa juridicamente incapaz viole à sua liberdade e dignidade. Pretende-se, assim, revisitar o conceito de (in)capacidade, contribuindo para a proteção da pessoa humana em sua dignidade.

 

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Capacidade legal e capacidade mental

 

Nas últimas quatro décadas, a maioria das leis formuladas em países desenvolvidos, adotaram textos legais mais flexíveis em seus sistemas de curatela, com medidas de intervenção graduais e tipos diferentes de supervisão e limitação ao exercício autônomo de direitos, de acordo com o grau e a classe de competências faltantes à pessoa a quem se pretende atribuir proteções especiais da cidadania. Enfatizam que a decisão de limitar o exercício autônomo de direitos, designando-se um curador, não deve repousar tão somente sobre a existência de um diagnóstico psiquiátrico, mas deveria também levar em conta o nível de funcionamento sócio-pragmático-adaptativo. Abre-se assim um leque inovador de recursos que permitem que indivíduos mentalmente prejudicados recebam assistência na tomada de decisões, preservando-se assim, a essência de seus direitos. No entanto, verificamos nas leis que regem a interdição civil no Brasil e outros países, não haver uma definição de critérios claros para aferição da capacidade civil dos indivíduos com transtornos mentais. É essencial que pesquisas futuras se preocupem mais com este aspecto, mantendo uma boa comunicação com os juristas interessados neste tema.

 

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A representação civil

 

 

Geralmente o interessado atua por expressão de sua vontade, no contexto da autonomia privada, na realização dos seus direitos civis contraindopessoalmente obrigações e, assim, praticando seus atos da vida civil. Contudo, há a possibilidade de outro praticar atos no lugar do interessado, por meio da representação. A representação é a relação jurídica pela qual certa pessoa se obriga diretamente perante terceiro, por meio de ato pra­ticado em seu nome por um representante. (SILVA, 2008). Entretanto, para que esta situação ocorra, é necessário, primeiramente, que o ordenamento jurídico a permita e, em segundo lugar, que os requisitos desse mesmo ordenamento tenham sido cumpridos. O instituto da curatela, pode ser visto como uma representação de fundamental relevância para a proteção dos incapazes com o objetivo de garantir os direitos fundamentais do indivíduo e de seus bens. O Código Civil Brasileiro (CC) lista as pessoas que possuem legitimidade para requerer a curatela, hoje restrita aos direitos patrimoniais. A decisão, leva em consideração possível escolha do curatelado e ainda permite mais de um curador. O instituto cursa com a devida proteção do Estado. De igual modo, a curatela, instituto clássico no direito civil, não perdeu sua importância e ainda exerce de maneira funcional a sua finalidade, que é proteger as pessoas e os bens deste que não possuem condições de exercer os atos da vida civil.

 

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Diagnóstico: necessário, mas não suficiente.

 

 

Em 2003, o Código Civil Brasileiro, inovou com a delimitação dos

chamados direitos da personalidade. Diferencia-se a personalidade da capacidade, pois a personalidade é atributo do sujeito, inerente à sua natureza, e a capacidade é a aptidão para o exercício de atos e

negócios jurídicos. Dois grandes princípios regem a matéria da

capacidade: o primeiro é o de que a capacidade se destina à prática

dos negócios jurídicos, e não ao fato jurídico, e o segundo, a capacidade é a regra e a incapacidade a exceção.

 

O legislador adotou basicamente quatro critérios para determinar a

capacidade: a idade, a integridade psíquica, a aculturação e a

localização da pessoa.

 

A lei divide as pessoas físicas em capazes e incapazes, sendo que as

capazes podem praticar atos e negócios jurídicos e as incapazes

necessitam do auxílio ou intervenção de mais alguém para praticar tais atos.

 

O art. 6° da Lei n° 13.146/2015 deixou claro que a deficiência não

afeta a plena capacidade civil da pessoa, para:

a) casar-se e constituir união estável;

b) exercer direitos sexuais e reprodutivos;

c) exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter

acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento

familiar;

d) conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização

compulsória;

e) exercer o direito à família e à convivência familiar e

comunitária;

f) exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

A ordem jurídica reconhece ao sujeito a capacidade para a aquisição de direitos e para exercê-los por si mesmo, diretamente, ou por

intermédio, ou com a assistência de outra pessoa, não havendo

restrições à capacidade, entendendo que quem tem aptidão para adquirir direitos deve ser hábil a gozá-los e exercê-los, por si ou por via de representação.

 

Com a nova Lei, há garantia do exercício da capacidade legal por parte do portador transtorno mental, em igualdade de condições com os demais sujeitos. A curatela passa a ser medida excepcional e extraordinária, devendo constar da sentença as razões e motivações de usa definição, preservados os interesses do curatelado. O art. 84, §1°, do EPD, enfatiza que, quando necessário, a pessoa com deficiência será submetida a curatela, proporcional às necessidades às circunstâncias de cada caso, durando o menor tempo possível. Nestes casos fica claro a regra que diz que o diagnostico é necessário para se caracterizar da incapacidade, sempre de modo parcial, e transitório, exigindo a tipificação desta incapacidade, a partir do exame da funcionalidade e autonomia do sujeito frente ao seu adoecimento e sua capacidade de fazer laço social.

 

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Os limites da inteligência e os limites da autonomia

 

Marcela Sena Braga

 

A inteligência pode ser definida como uma capacidade mental muito geral que permite raciocinar, planejar, resolver problemas, pensar de maneira abstrata, compreender ideias complexas e aprender (Flores-Mendoza et al., 2006). Há formas diferentes de se estudar as condutas inteligentes, seja por testes padronizados, avaliação do processo cognitivo e das influências genéticas e das diferenças provenientes do ambiente sobre as diferentes inteligências (Flores-Mendoza et al., 2006). Os rendimentos da inteligência se encontram abaixo do normal, ou seja, há um déficit intelectivo, em duas situações: no desenvolvimento deficiente e na deterioração cognitiva.

 

A avaliação das alterações psicopatológicas da inteligência e suas implicações no contexto da autonomia permitem estimar a capacidade do sujeito de exercer direitos e cidadania. A capacidade funcional do sujeito esta diretamente ligada à inteligência, uma vez que sua síntese psíquica, intencionalidade adaptativa e responsabilidade estarão diretamente articuladas ao modo como ele entende, mantém informações, bem como as usa para construir decisões, escolher caminhos de preferência, avaliando riscos, tomando decisões, comunicando-as como linguagem e aprendendo com seus erros em contexto social demonstrando capacidade de autogestão (Lauar, 2017).

 

Transpor a logica semiologica psiquiatrica para o exame da forma como a autodeterminação é legalmente construída, percebida e gerenciada nos permitira falar sobre avaliação da capacidade civil. Os pacientes portadores de deficiências cognitivas e comunicativas são vulneráveis ​​e precisam de apoio para ter acesso aos seus direitos para que possam realizar a plena cidadania. No nível internacional, esta necessidade é reconhecida na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, afirmando que todas as "partes devem tomar as medidas adequadas para proporcionar acesso de pessoas com deficiência ao apoio que possam exigir no exercício de sua capacidade legal '' (ONU, 2006, artigo 12)

 

Criar critérios para a avaliação das alterações psicopatológicas da inteligência e suas implicações no contexto da autonomia pode interferir diretamente na ampliação da garantia direito ao exercício pleno da cidadania dos pacientes.

 

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A Personalidade Jurídica e seus Limites

Juridicamente, a personalidade pode ser tomada de duas perspectivas: subjetiva e objetiva. Na perspectiva subjetiva, a personalidade é o atributo genérico que permite que alguém seja considerado como sujeito de situações jurídicas subjetivas. É por ela que alguém é, sob o ponto de vista do Direito, uma pessoa, o que pode ser concedido a seres humanos (pessoa natural) ou a outros entes a que o Direito, por razões práticas, outorga esse “status” (pessoa jurídica).
A consideração da personalidade em sentido subjetivo permite que alguém seja considerado, amplamente, sujeito. Nesse ponto, é importante questionar a posição daqueles que, embora concebidos, ainda não nasceram. Teriam eles personalidade?
A outra perspectiva é a personalidade em sentido objetivo, isto é, a personalidade tomada nos aspectos que podem figurar como objeto de proteção em relações e situações jurídicas. São os direitos da personalidade, que se referem aos aspectos próprios da pessoa, que a definem e a individualizam, e são essenciais à própria dignidade do ser. Nesse sentido, honra, imagem, integridade psíquica, manifestação do pensamento, intimidade e outros tantos são direitos referentes à personalidade e, por serem necessários, caracterizam-se pela intransmissibilidade e indisponibilidade. Mas quais as exceções a isso? Pode o sujeito renunciar a seu direito à privacidade? E o seu corpo, é passível de alteração voluntária, ainda que haja modificação permanente?
Os direitos da personalidade devem conviver em um universo de autodeterminação do seu titular, o problema é saber quais os limites dessa autonomia.

 

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LIVRE EXPRESSÃO DA VONTADE
 

Classicamente, o conceito de vontade é apresentado paralelamente aos conceitos de impulso e instinto. Segundo Jaspers, os impulsos não possuem conteúdo ou direção, ao contrário dos instintos e vontades. Enquanto os instintos possuiriam fim inconsciente, os atos de vontade seriam a expressão de representações conscientes, fortemente influenciada por processos afetivos e cognitivos determinados por variáveis neurobiológicas e psicossociais. Falar em vontade implica falar em capacidade de escolha e na existência de uma consciência que permite inibir ou promover a expressão dessa escolha. Entende-se, assim, que enquanto o impulso encontra aleatoriamente um objeto, o instinto procura seu objeto e a vontade elege o objeto.

 

A distinção entre esses três conceitos é de suma importância em psiquiatria forense, uma vez que se associam com a avaliação da capacidade de determinação. Para tal discussão é útil resgatar os conceitos de Hobbes, que considerava as escolhas e decisões como manifestações de pressões internas, colocando o homem livre como aquele que age somente conforme sua vontade.

Seguindo tal raciocínio, a liberdade seria qualidade indissociável da vontade. Entramos aí, nos debates filosóficos sobre liberdade e livre-arbítrio: a vontade é um ato permitido pela liberdade, distinguindo-se do livre-arbítrio, atrelado à racionalidade e por ela possível, representado pelo poder de escolher entre diferentes possibilidades. Finalmente, liberdade e livre-arbítrio dialogam com o Direito Penal nos conceitos de responsabilização, culpabilização e punição, assim como com o Direito Civil, nas discussões sobre capacidade civil e autonomia.

 

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Limites da perda do contato com a realidade e limites da autonomia

 

A Organização das Nações Unidas adotou resolução em dezembro de 2006 que estabeleceu a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência (CIDPD), reconhecendo o direito universal à capacidade legal desses indivíduos e enfatizando as relações de apoio como forma de exercê-la.

A Lei Brasileira de Inclusão (Lei 13.146/2015) entrou em vigor em janeiro de 2016 e trouxe afirmou a autonomia e a capacidade dos cidadãos com deficiência para exercerem atos da vida civil em condições de igualdade com as demais pessoas em alinhamento a CIDPD.

Partindo de uma abordagem psicopatológica e fenomenológica, propomos pensar a perda de contato com a realidade e suas repercussões na síntese psíquica, na intencionalidade e responsabilidade do sujeito. O juízo é uma operação complexa que atesta o modo como o sujeito acessa a realidade perceptualmente, interpretativamente ou imaginativamente, determinando por sua vez as relações interpessoais, os interesses em geral, a gestão do patrimônio e de si mesmo. Vale anotar que esta condição pode alterar a síntese psíquica, a intencionalidade, mas nem sempre a responsabilidade. Devemos nos afastar da ideia de que delírio é desrazão e nos aproximar da verdade kantiana de que existe razão na loucura.

A nova legislação questiona a natureza da incapacidade, afirmando o exercício dos atos da vida civil para as pessoas com deficiência com foco na igualdade e autonomia. Devemos aceitar esta provocação e a partir de um refinamento semiológico discutirmos no caso dos transtornos delirantes as condições de autonomia nas quais a representação civil não será necessária.

 

 

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A TEORIA DAS INCAPACIDADES NO DIREITO CIVIL BRASILEIRO
 

No início de 2016 entrou em vigor a Lei n. 13.146, que “Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência” e é apelidada de Estatuto da Pessoa com Deficiência – EPD. Passou-se a ter um microssistema jurídico de proteção e promoção da pessoa com Deficiência junto ao Direito brasileiro. A legislação trata do direito à igualdade e não discriminação; direitos fundamentais como saúde, acessibilidade e educação; direitos sociais como o trabalho, previdência e moradia; por exemplo.

A legislação efetiva a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – Carta de Nova York, que se incorporou ao Direito brasileiro por meio do Decreto n. 6.949, de 25 de agosto de 2009, e, considerando que sua aprovação se deu nos termos do disposto no §3º do artigo 5º da Constituição da República de 1988, a dita convenção tem status de norma constitucional.

Interessa-se, em particular, verificar as alterações trazidas quanto à proteção e à promoção da pessoa com deficiência no que tange à sua (in)capacidade civil, em especial no que tange à definição de deficiência, a importância do laudo multidisciplinar e o conflito de leis, como no caso do Decreto n. 3.298/99. Por fim, pretende-se apresentar o papel do Direito e, como se entende, para a psiquiatria forense junto à Teoria das Incapacidades no Direito Civil Brasileiro.

 

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A REPRESENTAÇÃO CIVIL


 

 

A Representação civil da pessoa, ou melhor, a capacidade Civil da pessoa, ficou profundamente alterada no Direito Brasileiro a partir de 2015, com o Estatuto da Pessoa com Deficiência – EPD, Lei n.º 13.146/2015. A partir daí não há mais pessoas incapazes, mas pessoas com deficiência. Esta nomenclatura instala um novo significante, e um novo paradigma para a demarcação da capacidade ou incapacidade civil.

A curatela, então, passa a ter um sentido muito mais de proteção, do que de interdição. Pessoas e direitos não devem ser interditadas, mas sim, protegidas. E é assim que a curatela no novo ordenamento jurídico instala um outro sentido de proteção para que as pessoas com deficiência possam continuar exercendo sua cidadania e seus direitos civis, como casar, votar, ter filhos etc.

 

 

 

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Limites da Memória e Limites da Autonomia

 

A Memória de Longa Duração pode ser dividida em explícita ou declarativa, que envolve a evocação de fatos e eventos, e memória implícita ou não declarativa, onde a informação é aprendida sem a memorização consciente do evento aprendido. A memória declarativa pode ser dividida em memória episódico e semântica. A memória episódica refere-se ao armazenamento de eventos autobiográficos, com frequência associados à informação contextual de tempo e lugar. A memória semântica é definida como a memória para a aquisição do conhecimento geral, incluindo do significado de palavras, e pode ser evocada sem informação contextual.
No que se refere à disfunção dos diferentes tipos de memória, os déficits de memória episódica têm sido associados a níveis de incapacidade funcional, principalmente no que se refere à aderência ao tratamento medicamentoso em geral, e à incapacidade laboral. A associação entre desempenho da memória e atividades instrumentas de vida diária está presente em vários grupos de pacientes, por exemplo, aqueles com demência como a doença de Alzheimer e a demência vascular, Traumatismo Crânio Encefálico, e Transtorno Cognitivo Associado ao HIV. Entretanto, alguns fatores além do desempenho em testes de memória episódica, como a idade e o nível cognitivo e ocupacional pré mórbido, a presença de reserva cognitiva e reserva funcional, podem contribuir também para o acometimento das atividades instrumentais de vida diária.

 

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Tomada de Decisão Apoiada

 

O instituto da Tomada de Decisão Apoiada, inspirado no Código Civil Italiano, representa um novo meio protetivo introduzido no Ordenamento Jurídico Brasileiro, pela Lei 13.146 de 06 de julho de 2015, conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência.
A Tomada de Decisão Apoiada beneficiará aquelas pessoas que tenham discernimento suficiente para expressar sua vontade, porém são possuidoras de certa vulnerabilidade de cunho físico, sensorial ou intelectual, definitivo ou transitório, que inviabiliza a tomada de ações para gerir os atos da sua vida civil de forma segura. Tais decisões podem ser afetas a direitos patrimoniais ou, excepcionalmente, direitos existenciais, desde que garantida a dignidade do beneficiário.
Considerados tais pontos, a Tomada de Decisão Apoiada é definida pelo art. 1.783-A, caput do CC/02, como “o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos duas pessoas idôneas, com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, para prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre os atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e informações necessários para que possa exercer sua capacidade.”

Trata-se, portanto, de um novo instituto jurídico que não incapacita a pessoa, como a ação de curatela, mas tem como fim auxiliar e dar um suporte as pessoas legitimadas para tanto a tomarem certas decisões da vida civil, que envolvem, em regra, patrimônio e negócios, de forma que as pessoas denominadas como apoiadores, atuarão de forma limitada nos termos do apoio estabelecido, não representando e nem assistindo o apoiado, apenas auxiliando nas escolhas a serem feitas.

 

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Capacidade civil e capacidade mental

 

O principio da dignidade da pessoa humana é fundamental para se pensar a existência humana, e os mecanismos de proteção dos direitos humanos capazes de garantir o mínimo existencial de forma igualitária no contexto da vida coletiva. Igualar não significa necessariamente que todos em todas as situações todos devem ser tratados de forma igual. É a desigualdade que por vezes faz o papel de igualar as pessoas. Diante de diferentes deve haver normas diferentes, para não haver discriminação. A pessoa portadora de deficiência tem, pela sua própria condição, direito à dignidade da pessoa humana, que se viabiliza pelo tratamento isonômico jurídico do Estado, ou seja, pela ruptura do padrão quando essa for forma de garantir a igualdade e a dignidade humana.

Assim o direito à igualdade, é o que está implícito no direito à inclusão da pessoa portadora de deficiência, fazendo valer princípios constitucionais de 1988, no Brasil.

Para o Direito, Personalidade é a aptidão para ser sujeito de direitos e obrigações. Sujeitos de direitos são as pessoas: natural ou física e jurídica. Todo sujeito de direito é necessariamente titular de facto de relações jurídicas. Nem todas as pessoas são detentoras da capacidade de fato, ou seja, nem todas as pessoas podem praticar pessoalmente os atos da vida civil, necessitando a intervenção de um terceiro, pela assistência ou representação. Essa intervenção é prevista para proteção das pessoas e segundo o princípio da igualdade, constitucionalmente previsto.

As pessoas que não têm capacidade de fato são chamadas de incapazes. O legislador adotou um critério objetivo para estabelecer a capacidade jurídica: a idade e a saúde metal. Portanto, incapacidade é um conceito jurídico, que formula uma pergunta a psiquiatria forense: o que é a capacidade e (In)capacidade mental?

Em 6 de julho de 2015, a Lei 13.146/2015, que institui o Estatuto da Pessoa com Deficiência adiantou no discurso jurídico que a incapacidade não deve ser pensada como equivalente a nosologia. Admitiu que os diagnósticos são necessários mas não suficientes para se definir a incapacidade. Solicitou que a incapacidade fosse demonstrada tecnicamente e alertou que a incapacidade pensada de modo quantificado preservasse cidadania e definisse níveis variados de autonomia, impedindo morte social.

A proposição legal retoma a distinção entre direitos de personalidade e direitos patrimoniais e coloca fim a interdição total. Os direitos da personalidade são dotados de certas características peculiares, quais sejam: A) são absolutos, isto é, são oponíveis contra todos (erga omnes), impondo à coletividade o dever de respeitá-los;  generalidade, os direitos da personalidade são outorgados a todas as pessoas, pelo simples fatos de existirem; C) extrapatrimonialidade, os direitos da personalidade não possuem conteúdo patrimonial direto, aferível objetivamente; D) indisponibilidade, nem por vontade própria do indivíduo o direito da personalidade pode mudar de titular; E) imprescritibilidade, inexiste um prazo para seu exercício, não se extinguindo pelo seu não-uso; F) impenhorabilidade, os direitos da personalidade não são passíveis de penhora; e, G) vitaliciedade, os direitos da personalidade são inatos e permanentes, acompanhando a pessoa desde seu nascimento até sua morte. O direitos patrimoniais disponiveis são aqueles referentes a patrimônio em que as partes podem usar, gozar e dispor, que podem transacionar livremente, de acordo com a vontade, pactuando entre situações em conformidade com seus anseios.


Com esta estratégia garante que os direitos de personalidade não sejam em tese alijados dos cidadãos e que os direitos patrimoniais possam ser exercidos pessoalmente, com assistência ou por representação de terceiros.

Como a psiquiatria forense se organizará para responder as estas proposições? Como pensar a capacidade mental e seus limites? Como pensar as diversidades transindividuais das organizações psíquicas, fora de padrões normativos, mas com o reconhecimento de autonomias suficientes capazes de exercer seus direitos civis numa rede de apoio solidaria e coresponsável ?

 

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A avaliação do discernimento (Entendimento)

 

A avaliação da capacidade de entendimento (CE) tem diferentes aplicações e compreensões, a depender do contexto Jurídico, Legislação e/ou Regulamentação vigentes. Apesar das diferenças, a CE tem como cerne o exame da capacidade de discernimento do examinando, que se dá através do exame de elementos psicopatológicos relativos à sua cognição (ex.: pensamento, memória e raciocínio lógico-formal e abstrato), que devem ser contextualizados com os elementos psiquiátrico-forenses apropriados à cada caso singular. 
A subjetividade do entrevistador, variações em terminologias, redações de textos legais e entendimentos jurídicos acerca de elementos psiquiátrico-forenses; são fatores que demonstram a complexidade, além de aspectos de vulnerabilidade técnica, da avaliação da CE (em seus diferentes contextos). Cabe à psiquiatria forense elaborar metodologias de investigação para superar tais vieses e trazer maior credibilidade científica ao exame psiquiátrico forense. 
O objetivo desta apresentação será abordar e discutir os aspectos psiquiátrico-forenses relativos à avaliação da CE, possibilidades à superação de seus vieses e as novas tendências neste tipo de avaliação na psiquiatria forense.

 

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O sujeito e suas diferentes formas de inscrição no laço social

 

 

O sujeito está morto?, diluído em determinações biológicas, políticas e culturais invisíveis, mas efetivas, que fariam dessa noção uma mera ideologia vazia de significação? Ou em algum ponto haveria uma justificação ética para que os humanos sejam contados um a um e valorizados em sua singularidade e diferença?

As sociedades modernas foram constituídas justamente a partir da ideia de que o individuo é um principio e um valor em si e que deve ser respeitado e protegido em sua diferença face ao Estado. Tal perspectiva política coloca imediatamente algumas questões cruciais: como conciliar o direito à idiossincrasia de cada posição subjetiva como a vida em sociedade? Como conceber e manejar politicamente essa tensão intrínseca às formas contemporâneas do laço social?

Seja como for, essa própria problemática demonstra bem que a noção de “sujeito” não se refere a um objeto do mundo, mas a relações dialéticas que implicam e supõem igualmente o Outro. Nesse sentido, ela escapa ao mero âmbito das ciências naturais, solicitando assim uma racionalidade e uma ética especificas. O sujeito só pode vir a existir lá onde ele é suposto poder advir. Dessa forma, “sujeito” e “dignidade” seriam dimensões éticas inseparáveis.

 

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A assistência e os limites do cuidado
 

A lei 13.146/2015 entrou em vigor em um momento relevante e significativo em que se busca fazer valer garantias de direitos a pessoas com deficiência, que vivem em desvantagem real em diversas esferas com relação aos sem qualquer anormalidade. É de fato um ganho tal iniciativa e coloca grande importância num tema relegado durante a maior parte da história. Como nada pode ser perfeito, especialmente algo inicial, surgem algumas inconsistências que podem causar prejuízo em situações específicas. Suponhamos o caso de um deficiente mental grave, que sofra de delírios e alucinações recorrentes, mas que apresente melhora com tratamento psiquiátrico. Nós psiquiatras identificamos com relativa frequência pacientes como o do exemplo suposto que, influenciados por seu quadro psiquiátrico, que prejudica seu juízo e seu discernimento, desejam abandonar o tratamento. Seria esse indivíduo de fato “protegido” pela nova lei, que afirma no seu parágrafo sexto que sua capacidade civil é plena? Seria a melhor medida ele próprio escolher tratar-se ou não, mesmo com o conhecimento médico científico e com o conhecimento médico prático, indicando ganhos significativos. O contraponto seria “qual é o limite desse cuidado”? Alguém (Quem?) tem o direito de decidir isso? Vamos extrapolar e supor o caso de um adulto portador de um câncer terminal, em que é possível tratamento paliativo que prolongue a sua vida por meses ou anos. Ele tem de aceitar esse tratamento? E se esse adulto for um deficiente mental? Algo muda? Nessa mesa-redonda, o objetivo é discutir tais questões.

 

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Acessibilidade e Cidadania

 

Pretendo delimitar a presença de uma forma ampliada de se pensar a cidadania, que certamente guarda diferenças em relação ao modelo clássico, mas que se coloca como uma reflexão para o impasse que as relações entre doença mental e a cidade nos colocam. A contemporaneidade trabalha com uma redefinição dessas ideias, propondo a concepção de um direito a ter direitos, não se limitando a conquistas legais ou ao acesso a direitos previamente definidos, mas antes, à invenção de novos direitos, emergentes de dificuldades concretas do universo de parcelas da sociedade. Assim sendo, nuances do direito como a regulação da internação hospitalar ou do direito penal deverão se constituir como passos rumo à uma sutileza na concepção dos novos direitos, que deverão ser estruturados muito a partir de referenciais estranhos à ordem social, mas que podem ser escutados e apreendidos, se há de fato uma pretensão na construção de um modelo de cidadania para o doente mental. A cidadania pretendida a partir desse referencial requer um rompimento com a ideia de pertencimento, de integração social, de resgate, de dívida social, enfim, ela tem comprometimento com a constituição de sujeitos ativos, definindo o que eles consideram ser os seus direitos e lutando pelo seu reconhecimento. Ela deve ser uma estratégia a ser empreendida diretamente pelos excluídos e não de um grupo de supostos incluídos em prol dos excluídos. Assim sendo, as relações entre a cidade e os transtornos mentais nos remetem inequivocamente ao universo discursivo da autonomia e seus desdobramentos.

 

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Capacidade jurídica e capacidade de fato. Realidade, sonho ou utopia.

 

O objetivo da temática é demonstrar se é realmente possível a capacidade jurídica, ditada pela Lei nº 13.146/15, prevalecer sobre a incapacidade de fato e as consequências deste entendimento, caso prevaleça uma interpretação liberal desta aludida lei. Como exemplo de nossa preocupação basta citar o art. 6º da lei antes aludida, a determinar que a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa para: casar-se e constituir união estável (casamento é um contrato solene, a exigir capacidade do agente. União estável é um contrato); exercer o direito de decidir sobre o número de filhos; exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. Assim e diante de tais permissões, a preocupação é com relação à prática de atos jurídicos, por pessoas realmente incapazes e se não são tais atos nulos, na ausência de vontade válida. A preocupação é também se estas pessoas não acabam prejudicadas, com tais propostas. O legislador deu capacidade a quem realmente não tem. Depois, para o incapaz há o instituto da interdição, cujo objetivo é escolher uma pessoa para representá-lo nos atos da vida civil. A interdição é um instituto assistencialista, em prol do incapaz, e não um castigo ou um instituto excludente. Preocupa-nos também o entendimento de que o Estatuto da Pessoa com Deficiência tem por escopo garantir o exercício da autonomia privada das pessoas com transtornos mentais, eis que, para tanto, falta um requisito básico: discernimento.

 

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Acessibilidade e Autonomia

 

 

A suposição de que o ser humano, em sua constituição mais íntima, é o centro do mundo ganhou força na modernidade, consolidando o individualismo como modo hegemônico de subjetivação. Admite-se que Kant tenha contribuído com esse modelo ao estabelecer uma noção de autonomia ancorada na capacidade de cada um criar sua própria lei a partir do uso da razão. Há, nessa perspectiva, a crença em um indivíduo
autoconsciente e apto a dominar sua própria vontade em prol da gestão de si e de suas relações com o coletivo. Esse ideal, no entanto, não se sustentou ao longo de nossa história.
Nos tempos atuais, marcados pela lógica do capitalismo e pela fragilidade dos laços simbólicos e sociais, observamos a intensificação da noção de uma individualidade autossuficiente e livre para o exercício de suas escolhas individuais. Simultaneamente, no entanto, assistimos – conforme já anunciado por Foucault – uma expansão vertiginosa das normas e dispositivos que, tacitamente, regulam nossos corpos e nossas possibilidades de habitar o mundo. Se, por um lado, esse mecanismo parece minar nossa autonomia, por outro, ele apresenta furos e formas de subversão que nos indicam outras formulações do próprio conceito de autonomia.
Nesta intervenção, essa questão será evidenciada a partir de algumas experiências de pessoas transexuais, que, entre a violência dos protocolos e dispositivos, criam formas
inéditas de expressão. A acessibilidade dessas pessoas aos serviços assistenciais será problematizada de forma a fomentar um debate em torno de novos contornos de autonomia que contemplem transformações envolvendo, ao mesmo tempo, os
sujeitos, suas singularidades e o social.

 

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Limites executivos e limites da autonomia

 

        Segundo a definição de Lezak, as funções executivas se relacionam a processos mentais que envolvem a formulação, a antecipação, o planejamento, a monitorização e o desempenho com vistas a um objetivo. A neurocientista, Adele Diamond, identificou três funções nucleares de categorias de competência: controle inibitório, memória operacional e flexibilidade cognitiva.  Alguns estudiosos fazem uma distinção entre o componente "frio" das funções executivas, que envolve estritamente as habilidades cognitivas (por exemplo, a capacidade de fazer cálculos apenas com a mente) e o componente "quente", que reflete a capacidade de regular as emoções (por exemplo, a capacidade de controlar a raiva).

 

        Muitos transtornos neuropsiquiátricos podem afetar o desempenho executivo, consequentemente, o ajustamento social, acadêmico e laboral. Devido a sua importância, as funções executivas são extensamente avaliadas no exame neuropsicológico. A avaliação pode identificar deficiências e competências preservadas, fazer prognósticos e inferir sobre os sistemas neurais envolvidos nesses processos. A avaliação permite a comparação com o nível prévio de funcionamento de um indivíduo e com a média populacional por variáveis de faixa etária e escolaridade.

 

        Enfim, os sistemas frontais têm o caráter regulador das funções motivacionais, emocionais, afetivas, perceptivas, cognitivas e do comportamento em geral e sua preservação ou não pode modificar o desenlace de um laudo ou parecer, pois alterações no funcionamento executivo podem ser altamente incapacitantes.   

 

 

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A assistência e cuidado

 

O Estatuto da Pessoa com Deficiência, no afã de garantir e incentivar a autonomia dos deficientes, alterou profundamente as regras relativas à incapacidade. No entanto, algumas dessas novas regras não atendem ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, uma vez que generalizaram toda e qualquer forma de deficiência, sem levar em consideração as peculiaridades de cada caso concreto. Assim, esse novo panorama legislativo, passa a exigir de todos os envolvidos atenção redobrada, sob pena de prejudicar aqueles que são merecedores de cuidado e assistência.

 

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Medidas de cuidado sem incapacidade. 

 

A questão da fragilidade do paciente psiquiátrico, sobretudo em um contexto de possível discernimento comprometido, pode ocasionar a implementação de juízos redutivos ou degradantes de sua aptidão decisória. Tais juízos podem sugerir cuidados que mitigam, para além do necessário, a autonomia privada do paciente. Partindo-se da meta de concreção do direito à dignidade do paciente, pela via de ações para a disponibilização de mecanismos e espaços ao exercício de sua liberdade imersa em um contexto de igualdade democrática, cabe refletir, prospectivamente, medidas de cuidado, que independam de incapacidade previamente reconhecida e declarada. Trata-se, no contexto da relação médico-paciente, e, especialmente, no que toca à adesão e à condução da terapêutica, da percepção de posturas que observem e consonem com os comandos da cláusula geral de tutela da personalidade e de seus direitos correlatos, bem como com os deveres anexos de conduta espraiados pela força normativa do princípio da boa-fé objetiva. As aludidas medidas de cuidado sem incapacidade podem, portanto, possuir repercussões no campo da licitude de condutas e da responsabilidade civil do médico. 

 

 

 

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Equidade de direitos e capacidade civil

 

O objetivo desta apresentação é de problematizar a noção de equidade de direitos a partir de uma perspectiva genealógica. Utilizarei principalmente a noção de subjetivação e normalização em Michel Foucault e de propriedade social em Robert Castel para construir a história de nosso presente e de nossa democracia. Os conceitos destes autores foram construídos tendo como base o contexto histórico-social europeu e, sobretudo, francês. A proposta aqui não é de ‘aplicar’ os conceitos ao contexto brasileiro, mas sim pensar as distinções que, a partir de um efeito de espelho, possibilitam ver a forma como se estruturaram as relações de poder na história brasileira. As formas de emergência do sujeito moderno serão discutidas a partir da ruptura cartesiana, assim como os processos de (des)legitimação do indivíduo a partir dos marcadores social da diferença, principalmente, raça, gênero, sexualidade e classe. A noção de capacidade civil será confrontada com o jogo de verdicção que concede ao sujeito um estatuto de autonomia quanto ao exercício de seus direitos nas especificidades da precária cidadania brasileira.

 

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Capacidade legal e incapacidade mental

 

 

A Lei Brasileira de Inclusão de deficientes (LBI) entrou em vigor em janeiro de 2016, revogando e alterando diversos artigos do Código Civil de 2002. Entre as diversas alterações, a mais expressiva e polêmica é aquela contida no artigo 6º, que considera todas as pessoas com transtornos mentais civilmente capazes de forma plena, de modo semelhante às pessoas não portadoras de tais transtornos. E o artigo 84 é explícito ao determinar que “a pessoa com deficiência tem assegurado o direito de sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas”. No entanto, essa alteração é desprovida de sustentação psiquiátrica que a torne viável na prática forense. A Lei 13.146/2015 (LBI) contém uma série de equívocos, como por exemplo, a confusão entre liberdade e autonomia. Ela apenas dá liberdade, mas não pode dar autonomia a pacientes com incapacidade mental, portanto sem recursos psíquicos para tal.  Nesse encontro, será discutido como o psiquiatra forense se posiciona em seu laudo pericial na esfera cível, sobretudo quando há uma divergência entre o resultado de sua perícia que conclui por uma incapacidade mental e a LBI determinando a capacidade legal plena.

Referências

1. Abdalla-Filho E. Psychiatric evaluation of civil capacity with the new Brazilian Statute of the Person with Disabilities. Rev. Bras. Psiquiatr., ahead of print  Epub May 22, 2017.